A classe trabalhadora tá cansada !!
A classe trabalhadora tá cansada !!
Nos últimos tempos, o conceito de quiet quitting está em alta. A tradução literal do termo faz referência a uma “demissão silenciosa”, mas não é bem assim. Em bom português, basicamente, o termo quer dizer “eu faço o que me pagam para fazer”.
Minha mãe sempre falou uma coisa que faz todo sentido nesse assunto: o combinado nunca sai caro. Ou, no caso dos nossos empregos, o combinado vai sair exatamente no preço estipulado em contrato.
Apesar de ninguém gostar muito, as pessoas não estão desistindo de trabalhar!!! No entanto, estamos sim desistindo da ideia de “vestir a camisa” das empresas enquanto sacrificamos nossa saúde mental e vida pessoal — sem ganhar a tão esperada recompensa financeira por isso.
Fazer o necessário. Empurrar com a barriga. Jogar sem tesão. Falta de comprometimento. Chame do que você quiser, mas esse silêncio demonstra uma única coisa: a falta de capacidade das empresas em ouvir. Mais do que nunca, as pessoas imploram por um tratamento humanizado. Segundo dados do Departamento do Trabalho, somente em março de 2022, mais de 4,5 milhões de pessoas pediram demissão dos seus empregos. Em meio a uma crise econômica e uma taxa altíssima de desemprego no Brasil, esse dado deveria fazer a gente repensar sobre a responsabilidade das empresas.
Essa “falta de interesse das gerações mais novas”, como costumam dizer, é sempre jogada no colo da classe trabalhadora. Mas por que as empresas insistem em se eximir de qualquer culpa ou responsabilidade nesse processo? Falta de oportunidades claras de crescimento, expectativas não comunicadas, ambiente desacolhedor, rotina tóxica, falta de reconhecimento financeiro, pressão por resultados e, por fim, lideranças despreparadas são responsabilidade somente das empresas.
Tudo isso faz parte de um contrato que algumas pessoas, acertadamente, não querem mais assinar. A pesquisa Workmonitor revelou que 92% das pessoas que trabalham anseiam por formatos e carreiras mais flexíveis, tendo a oportunidade de seguir uma rotina de atividades que vá além do trabalho. Esse dado deixa explícito que, cada dia mais, valorizamos lugares que se preocupam com as suas pessoas, permitindo um equilíbrio entre vida pessoal e vida profissional.
Para o psicólogo organizacional Adam Grant, o quiet quitting não tem nenhuma conexão com a preguiça. Ele é uma resposta a empregos ruins, salários inadequados e lideranças abusivas. Adam também diz que, quando as pessoas não se sentem levadas em consideração, param de se importar. E, para as empresas, uma resposta para mudar esse cenário seria começar com um bom trabalho, pagamento justo e respeito pela sua equipe.
Obviamente é impossível tirar questões de classe, raça e gênero desse contexto. Eu, enquanto mulher cis e branca, reconheço os privilégios que tenho. Afinal, na maioria das vezes, a gente sabe que o direito à mediocridade é um privilégio somente para pessoas como eu. Mas também é importante não nos acostumarmos com um sistema que sempre busca (e encontra) novas maneiras de tentar sugar até a nossa alma — e ainda nos culpar por isso.
Por fim, quero trazer um último ponto. Em discussões como essa, é bom a gente lembrar daquilo que nem todos os países têm: CLT e direitos trabalhistas. O conceito de quiet quitting surgiu justamente em um país que é conhecido pela falta desses direitos — os Estados Unidos. Em lugares assim, a classe trabalhadora precisa se desdobrar ainda mais para conseguir crescer na carreira, além de sofrer com a falta de segurança trabalhista. Infelizmente, nos últimos anos, essa perda de direitos também tem sido uma tendência no Brasil. Reformas trabalhistas, negociar com o patrão e a “pejotização” das profissões são sempre trazidas como elementos que vão ajudar o país a crescer e fomentar a criação de novos empregos. Mas o fim a gente sabe: quem perde sempre são os empregados e empregadas.
Amém direitos trabalhistas?
Amém direitos trabalhistas! 🙏
Texto por Fernanda Almeida, redatora na Shoot.